toque, sabe o que é? uma dor nascente. ainda repousa, tão quieta que parece uma esperança, mas estas são tão verdes e nunca crescem mais que limões, você jamais as confundiria, só quando ainda muito pequenas… as dores são grandes, de um vermelho agudo, como maçãs argentinas quase fora da época boa. as dores são lindas quando ainda não colhidas, são de uma beleza ofuscante, de um sabor molhado nos lábios, um sabor de fome.
o fruto se afaga nas mãos e os olhos, na película lustrada. então, se lembra - lembra da outra vez que mordeu, da outra vez que o suco lhe tocou a língua, parecia bom, mas logo veio o amargo. e a fruta tão linda por fora, se mostra pequi por dentro. (os espinhos na carne doem de verdade, doem no silêncio, na multidão, doem.) o fruto, jogado longe, repousa e apodrece, mas os espinhos parecem sempre, sempre vivos.
num arbusto pequeno, mirrado, ainda floresce com um cheiro minguado de meia-estação o fruto esverdeado. quieto, depois que as feridas levaram o rubro e trouxeram a palidez, o pranto, um que de cor-de-madrugada, a sede de procurar-se mais e mais, tentar beber o suco da pequena esperança não parece má opção. a lembrança do sabor doce parece ir embora com o cheiro azedo de limão. sem água nos lábios, o desejo amarrado, resta a falta de força - como coragem. os lábios receiam, mas mordem. o suco jorra e jorra com um sabor de mel recém-tirado do favo. e há um que de brilho nos olhos que parece enchido de uma explosão do centro da terra… alegria.
os espinhos ainda permanecem na carne, mas esta - banhada de suco - parece anestesiada: quase já não dói. E quando perguntam se as feridas fecharam, responde:
- não e doem porque são feridas, marcam porque são ausências de mim, são reticências que me foram tiradas. doem, mas eu tento esquecê-las a todo momento, embriagado de algo que me traz um sorriso de alma: esperança.
está vendo este fruto? toque. é macio. sei que qualquer conselho que eu lhe possa dar, não irá deixá-lo longe, fender a pele escarlate é inevitável. estão vai, vai caminhar pelo bosque, colher seus frutos… só não esqueça do licor de toda Iracema, que inebria os heróis e deixa mais leve o pesar dos passos, o pesar da lança ferindo o peito, o pesar do mundo, do mundo. colha, por favor, um pouco mais de esperança - mesmo que não lhe pareça agradável, colha. por favor, por mim, por nós.
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