19.4.08

o homem de terno - parte final.

[leia a parte um, a parte dois, a parte três, a parte quatro a parte cinco]

Preciso de coragem para contar as próximas linhas, porém minhas mãos trêmulas impedem que eu escreva sem borrar - já rasguei quatro folhas de papel antes de terminar essa introdução -, tudo isso é fruto do meu medo. Não importa o que vivenciei, ainda me encolho debaixo das cobertas e digo o nome da minha mãe baixinho quando lembro dessa história. Sim, eu tenho medo de que, ao reviver esse velho causo, os seus personagens voltem para me assombrar.
Inspiro. Expiro. Deixo que o ar dessa manhã leve embora esse nó da minha garganta. Agora não tem volta, se cheguei até aqui, darei esse último passo. É importante dizer: sorriu maléficamente.

Gritei, como já foi dito, até perder o fôlego. Meu coração parecia estar em chamas. Não sei dizer se o que via era perverso, macabro ou os dois ao mesmo tempo. Balancei a cabeça, pisquei várias vezes, mas aquilo não ia embora - era real, material, vivo e intenso. Fiquei com medo e apavorado. Desviei os olhos para o chão: vi seus pés descalços sobre a grama orvalhada - as pequenas flores roxas pisoteadas pareciam gotas de sangue velho. Temia fitar seus olhos, apesar de sentir que estava me olhando. Foi então que vi as suas mãos, a casa, o vitral, seus filhos. É importante lembrar: não houve briga.

Desculpa, preciso parar por aqui: não posso revelar esse segredo. Se não, o que contarei para meus netos? Qual grande feito escondido terei feito eu, além desse? Entendam que não quero ser uma lenda urbana - um herói ou um martire da rua Oscar Leite. Temo em dizer, mas chegamos ao fim. Eu dei as pistas, a resposta está dada, basta encontrá-la, vivê-la e, quando com muita certeza, contá-la para suas futuras gerações. Ou então, fiquem com a versão de que tudo não passou da imaginação fértil de um velho sobre um tempo já esquecido.
Mas lembre-se: eu tenho certeza que estava sóbrio.

fim.

Um comentário:

Tuma disse...

Hmm, muito boa sua história Stefano. Nada como esconder os segredos do leitor. Deixar que ele imagine tudo, que ele se torture conjecturando sobre o significado "daquilo tudo".
Espero mais coisas desse tipo.
Abraço.