Ele refletia sobre aqueles três últimos passos; olhou ao seu redor e percebeu que apenas ele e Deus compartilhavam aquele momento; deixou a brisa bater contra o seu rosto; fechou os olhos para não deixar uma lágrima escorrer; sorriu um sorriso nervoso e último; abriu os braços como se pudesse abraçar toda a cidade; estufou o peito com todo o ar que podia; sentiu que era a hora.
Com uma firmeza invejável, João deu aquelas últimas passadas e se jogou de cima do imenso aranha-céu onde trabalhava. Aquele filme da vida passou em sua cabeça - a infância em uma cidade pequena, a vinda para São Paulo, a falta de sossego, a traição da mulher, os filhos queridos, os pais, a bebida, o emprego bem-sucedido -, de repente uma imagem veio à sua lembrança: uma foto antiga tirada com toda a família em um Natal feliz. Foi então que ele entendeu a dor que sua família iria sentir com o seu ato, a falta que ele iria fazer, as lágrimas de sua mãe.
Angustiado elevou os olhos para cima, Deus continuava compartilhando o momento, mas não podia intervir na decisão do pobre homem: não havia volta.
Pediu desculpas para si mesmo; colocou a mão no coração que pulsava quente; estava com sua alma vazia; seu voou havia chegado ao fim.
Era Natal outra vez.
Nenhum comentário:
Postar um comentário