15.11.07

sobre viver de verdade.

Ele não se sentia bem, seu humor estava confuso, assim como suas idéias. Ele estava cansado da estável perfeição que se encontrava: as coisas davam certo e, quando não davam, se confortava pensando na próxima vez. Ele queria ousar, dizer não, viver de verdade.
Heitor havia decidido mudar de vez.
Encarou os fatos e decidiu deixar toda a sua rotina por um dia e poder ser ele mesmo. Logo de manhã, ele abasteceu o carro e saiu a procura de nada.
"O melhor da vida é não ter destino".
Decidiu pegar a estrada e ir para onde seu volante mandasse.
"Quanto mais longe melhor".
Passou em alta velocidade as árvores que beiravam o acostamento, abriu o vidro e deixou que o ar daquela manhã clara e linda enxesse seus pulmões.
"Por que eu nunca fiz isso?"
Começou a cantar uma ou outra canção do seu jeito: sem rítmo, desafinado e com emoção.
Virou em uma bifurcação pouco conhecida.
Trocou de música.
Se sentiu sozinho: ele, seu ego e seus sonhos.
Estava na hora da primeira parada: tomar café-da-manhã no posto. Ele sabia o que iria pedir - o mesmo que seu pai pedia quando paravam no meio de qualquer viagem -.
- Um pingado, um pão-de-queijo e um pacote de bala-de-goma.
O cheiro do café-com-leito era de infância e o sabor, de lembrança.
De volta ao carro, sentiu um pouco de peso na consciência de não ter ido ao escritório.
"Se eles estiverem se perguntando por mim?"
Tentou esquecer do trabalho.
"Eu não preciso daquilo, olha onde eu estou!"
Mas a dor-de-culpa matava-o por dentro.
"Preciso trabalhar".
Engoliu uma bala-de-goma à seco.
Se conformou em voltar.
Voltar para sua reconfortante perfeição.

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